Milhares de exoplanetas já foram descobertos |
Em uma noite de inverno em janeiro de 1995, o estudante de astronomia Didier Queloz deveria estar observando o espaço. Mas a chuva que atingia o observatório de Haute-Provence, no sul da França, o impedia de fazer isso.
Já que o tempo não cooperava, ele foi à biblioteca para criar um programa para analisar os dados que já havia coletado.
Os dados sugeriam que uma estrela brilhante chamada 51 Pegasi tremia ligeiramente. Era o tipo de oscilação que Queloz estava procurando - um movimento estelar que poderia indicar a presença de um planeta.
A descoberta de um planeta em torno de outra estrela que não o Sol seria uma das descobertas mais profundas da história humana.
Ela indicaria que o Sistema Solar não era único. E nos deixaria mais próximo de descobrir se haveria outras formas de vida em lugares distantes, redefinindo nosso lugar no Universo.
Então Queloz tinha que ter certeza. Após coletar mais dados e analisá-los, ele percebeu que a oscilação da estrela era real, provocada pela atração da gravidade de um planeta em sua órbita.
"Nesse momento, eu era a única pessoa no mundo que sabia que eu havia encontrado um planeta", conta Queloz. Mas ele sabia também que era algo importante demais para se cometer algum erro. "Eu estava com muito medo", diz.
Mas ele estava certo. "A descoberta dele fez história", comenta Steve Vogt, astrônomo da Universidade da Califórnia em Santa Cruz. "Isso abalou totalmente nosso campo de pesquisas."
Hoje em dia, graças ao telescópio espacial Kepler, os astrônomos já descobriram milhares de planetas. De acordo com as estimativas, nossa galáxia tem centenas de bilhões de planetas, incluindo alguns do tamanho da Terra e que poderiam conter água líquida, com potencial para a existência de vida. Em agosto deste ano, um grupo de astrônomos descobriu que a estrela mais próxima do Sol, Proxima Centauri, tem um desses planetas do tamanho da Terra em sua órbita. Mas ninguém poderia ter previsto esses avanços há 20 anos, quando Queloz e seu orientador, Michel Mayor, da Universidade de Genebra, na Suíça, anunciaram a descoberta do planeta conhecido como 51 Peg b. Era uma afirmação fabulosa, mas como costuma acontecer com as descobertas científicas, não foi recebida com festa, mas com ceticismo. Para deixar claro, Mayor e Queloz não descobriram na verdade o primeiro planeta fora do Sistema Solar, ou exoplaneta. Em 1992, os astrônomos americanos Alex Wolszczan e Dale Frail havia encontrado dois planetas. Mas em vez de orbitarem uma estrela normal, como o Sol, esses planetas orbitavam uma estrela morta: um corpo estelar chamado pulsar, que emite poderosos raios de radiação pelo espaço. Era um sistema planetário estranho, que não poderia abrigar vida. Os astrônomos viam esses planetas na órbita de um pulsar como uma anomalia cósmica, não como algo promissor. Desde então, somente outros três planetas semelhantes foram encontrados.
Encontrar planetas na órbita de estrelas normais como o Sol parecia difícil demais. "Se você fosse a um encontro de astronomia e as pessoas perguntassem o que você fazia, não podia dizer que estava procurando outros planetas. Elas fugiriam de você como se estivesse cheirando mal", diz o astrônomo Paul Butler, do Carnegie Institution of Science, nos Estados Unidos. "Não faria nenhuma diferença se eu estivesse falando de homenzinhos verdes", conta. Junto a Geoff Marcy, da San Francisco State University, Butler havia iniciado a busca por exoplanetas em 1986. Utilizando instrumentos ultramodernos, eles tentavam detectar o tipo de movimento estelar que Queloz detectou. Júpiter, por exemplo, o maior planeta do Sistema Solar, provoca uma oscilação de cerca de 35 km/h do Sol. Detectar essas velocidades relativamente baixas a trilhões de quilômetros de distância não é fácil. Até os anos 1980, observa Butler, ninguém conseguia medir velocidades inferiores a 1.000 km/h. Para detectar essas oscilações estelares, eles precisavam medir o espectro da estrela: como sua luz se divide em comprimentos de onda que a constitui. Quando a estrela se move em sua direção ou no sentido oposto, o comprimento de onda de sua luz encurta ou se alonga, respectivamente. Essa pequena mudança é chamada de efeito Doppler. O problema é que pequenas vibrações nos instrumentos, mudanças de temperatura e outos fatores podiam causar alterações. Para ter alguma esperança de encontrar novos planetas, os cientistas precisavam eliminar essas incertezas.
"Nosso objetivo desde o início era encontrar planetas", diz Butler. "Mas nossa preocupação principal era o desafio técnico", afirma. Um avanço veio no início dos anos 1980. Dois astrônomos canadenses, chamados Bruce Campbell e Gordon Walker, desenvolveram uma técnica pioneira que podia detectar oscilações de 54 km/h. Com isso eles já teriam sido capazes de descobrir o primeiro exoplaneta antes de Queloz e Mayor, mas tiveram azar. Com melhorias e a evolução técnica, em maio de 1995 os cientistas liderados por Butler já eram capazes de medir velocidades de até 10 km/h. Mas cinco meses depois, eles receberam notícias da Europa: alguém havia encontrado um planeta, o 51 Peg b. Mayor levou meses para se convencer. Ele estava cético no início, pedindo a Queloz que fizesse mais análises para descartar possíveis explicações alternativas. "Eu era um estudante", observa Queloz, hoje pesquisador da Universidade de Cambridge. "Não era para eu encontrar um planeta." Mayor e Queloz mantiveram segredo sobre a descoberta enquanto checavam e rechecavam seus dados. Quando finalmente estavam convencidos, anunciaram sua descoberta em um encontro de astronomia no dia 6 de outubro de 1995, em Florença, na Itália.
Muitos astrônomos receberam a notícia com ceticismo. No passado, outros cientistas já haviam anunciado descobertas de exoplanetas que depois não se confirmaram. E havia o questionamento sobre o próprio 51 Peg b. O planeta é uma grande bola de gás, como Júpiter. Mas o estranho é que sua órbita é de apenas quatro dias. A distância do planeta para sua estrela é um sexto da distância de Mercúrio para o Sol, o que significa que sua superfície enfrenta temperaturas de até 1.000 graus Celsius. O calor expande sua atmosfera, tornando o planeta 50% maior do que Júpiter, embora seja 47% mais leve. Apelidado de "Júpiter quente", o planeta contradizia tudo o que os cientistas achavam que sabiam sobre os planetas. No Sistema Solar, os gigantes de gás como Júpiter estão longe do Sol. Esses planetas contêm gases e gelo, compostos voláteis que não sobreviveriam em ambientes mais quentes mais próximos ao Sol. Por isso os cientistas acreditavam que somente pequenos planetas rochosos, como a Terra, poderiam se formar na parte interna do Sistema Solar, enquanto os gigantes de gás se formariam na parte externa. O paradoxo de um Júpiter quente levou muitos cientistas a questionar o 51 Peg b. "A mentalidade na época era de que todos os sistemas planetários deveriam se assemelhar ao nosso", observa Butler. Por acaso, Butler e Marcy haviam agendado uma sessão de quatro dias em um observatório na semana seguinte. Eles passaram todas as noites apontando o telescópio para a estrela 51 Pegasi. "Olhamos os resultados e ficamos abismados", conta Butler. "Mayor e Queloz estavam certos. Nós obtivemos exatamente os mesmos resultados."
Vogt ainda não estava trabalhando com Butler e Marcy, mas acompanhava de perto seu progresso. O que o surpreendeu sobre os dados foi ver que, uma vez que eles soubessem o que deviam procurar, não era difícil detectar o 51 Peg b. Por causa de sua órbita curta, dados de apenas alguns dias eram suficientes para revelar a oscilação da estrela. "Se é tão fácil assim detectar, deve haver vários desses planetas", disse. "Eles vão começar a chover." Ao perceber que o 51 Peg b era apenas o início, ele se juntou às buscas. Enquanto Butler e Marcy melhoravam sua técnica, eles observavam estrelas, acumulando oito anos de coletas de dados. Mas eles não tinham capacidade técnica para analisar esses dados. Com a descoberta do 51 Peg b, outros cientistas ofereceram a eles seus computadores para ajudá-los a processar os dados. E Vogt estava certo - os planetas começaram a aparecer. Na manhã do último dia de 1995, Butler foi ao seu escritório para checar seu computador, que analisava dados de uma estrela chamada 70 Virgo. Ele observou então que o programa revelava um planeta com sete vezes o tamanho de Júpiter, orbitando sua estrela a cada 116 dias. A estrela oscilava com velocidades de mais de 1.000 km/h: o sinal mais brilhante e claro já encontrado, o que não deixava nenhuma dúvida de que era um planeta. "Não podia acreditar no início", conta Butler. "Por uma hora, fiquei só olhando a tela do computador."
Formação incerta Enquanto os americanos começavam a encontrar planeta atrás de planeta, os europeus liderados por Mayor também encontravam. As duas equipes acabariam descobrindo centenas de planetas, conforme a competição entre elas crescia na década seguinte. A maioria dos planetas descobertos inicialmente eram "Júpiters quentes" como o 51 Peg b. Como esses planetas são grandes e próximos às suas estrelas, provocam as oscilações mais fortes, deixando-os também mais fáceis de identificar. Nos anos seguintes, mesmo os mais ardorosos céticos, que propuseram explicações alternativas como estrelas pulsantes, estrelas binárias e manchas estelares, tiveram que aceitar que se tratavam de planetas reais. Mas como eles são formados ainda é algo incerto. Uma das explicações mais populares é a de que os planetas semelhantes a Júpiter sofrem uma migração. Eles se formariam longe de suas estrelas, mas se movimentariam depois para a parte interna por força das interações gravitacionais com outros planetas e com a poeira e os detritos cósmicos deixados pela formação do sistema estelar. 'Estamos sozinhos ou não?' Direito de imagem SETI Institute/Danielle Futselaar Image caption O Kepler-138b foi o primeiro exoplaneta menor que a Terra encontrado O que o 51 Peg b certamente fez foi deixar os astrônomos com uma mente mais aberta. Ele mostrou que, no que se refere aos planetas, é quase um vale-tudo, como observa Sara Seager, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos. "Ele determinou que todo o campo de pesquisas deveria esperar surpresas", diz. De fato, o telescópio espacial Kepler mostrou que a maioria dos sistemas planetários não se parece nada com o Sistema Solar. Lançado em 2007, o telescópio encontrou milhares de planetas. Em vez do método da oscilação usada para encontrar o 51 Peg b, o Kepler verifica diminuição na luz da estrela quando um planeta passa em frente a sua órbita. O Kepler encontrou órbitas planetares que são inclinadas, altamente elípticas, e vão contra a direção da rotação da estrela. Alguns planetas orbitam duas estrelas ao mesmo tempo. Os buscadores de planetas estão tão apurados que já encontraram um do tamanho da Terra, que poderia ter água líquida, na órbita da estrela vizinha Proxima Centauri, a apenas 4,2 anos-luz de distância. A descoberta gerou planos ambiciosos para uma viagem interestelar. Com telescópios espaciais como o Kepler e o ainda em desenvolvimento Satélite para Pesquisas de Exoplanetas em Trânsito (TESS, na sigla em inglês), que pode encontrar mais milhares de novos mundos, os astrônomos estão vendo os planetas não como indivíduos, mas como populações inteiras. Isso dá a eles um entendimento mais amplo sobre como os planetas se formam e também mostram como nosso Sistema Solar pode ser singular. Logo, uma nova geração de telescópios vai analisar atmosferas planetárias atrás de sinais de vida. Em poucas décadas, poderemos ter alguma indicação. "É uma questão básica humana para compreender: estamos sozinhos ou não?", diz Vogt. "É uma das questões mais profundas que podemos jamais imaginar. De qualquer maneira, isso vai abalar nossa cultura, toda nossa capacidade de pensamento, se pudermos responder a isso." Leia a versão original desta reportagem em inglês no site BBC Earth/
Potencial para a vida
Hoje em dia, graças ao telescópio espacial Kepler, os astrônomos já descobriram milhares de planetas. De acordo com as estimativas, nossa galáxia tem centenas de bilhões de planetas, incluindo alguns do tamanho da Terra e que poderiam conter água líquida, com potencial para a existência de vida. Em agosto deste ano, um grupo de astrônomos descobriu que a estrela mais próxima do Sol, Proxima Centauri, tem um desses planetas do tamanho da Terra em sua órbita. Mas ninguém poderia ter previsto esses avanços há 20 anos, quando Queloz e seu orientador, Michel Mayor, da Universidade de Genebra, na Suíça, anunciaram a descoberta do planeta conhecido como 51 Peg b. Era uma afirmação fabulosa, mas como costuma acontecer com as descobertas científicas, não foi recebida com festa, mas com ceticismo. Para deixar claro, Mayor e Queloz não descobriram na verdade o primeiro planeta fora do Sistema Solar, ou exoplaneta. Em 1992, os astrônomos americanos Alex Wolszczan e Dale Frail havia encontrado dois planetas. Mas em vez de orbitarem uma estrela normal, como o Sol, esses planetas orbitavam uma estrela morta: um corpo estelar chamado pulsar, que emite poderosos raios de radiação pelo espaço. Era um sistema planetário estranho, que não poderia abrigar vida. Os astrônomos viam esses planetas na órbita de um pulsar como uma anomalia cósmica, não como algo promissor. Desde então, somente outros três planetas semelhantes foram encontrados.
'Homenzinhos verdes'
Encontrar planetas na órbita de estrelas normais como o Sol parecia difícil demais. "Se você fosse a um encontro de astronomia e as pessoas perguntassem o que você fazia, não podia dizer que estava procurando outros planetas. Elas fugiriam de você como se estivesse cheirando mal", diz o astrônomo Paul Butler, do Carnegie Institution of Science, nos Estados Unidos. "Não faria nenhuma diferença se eu estivesse falando de homenzinhos verdes", conta. Junto a Geoff Marcy, da San Francisco State University, Butler havia iniciado a busca por exoplanetas em 1986. Utilizando instrumentos ultramodernos, eles tentavam detectar o tipo de movimento estelar que Queloz detectou. Júpiter, por exemplo, o maior planeta do Sistema Solar, provoca uma oscilação de cerca de 35 km/h do Sol. Detectar essas velocidades relativamente baixas a trilhões de quilômetros de distância não é fácil. Até os anos 1980, observa Butler, ninguém conseguia medir velocidades inferiores a 1.000 km/h. Para detectar essas oscilações estelares, eles precisavam medir o espectro da estrela: como sua luz se divide em comprimentos de onda que a constitui. Quando a estrela se move em sua direção ou no sentido oposto, o comprimento de onda de sua luz encurta ou se alonga, respectivamente. Essa pequena mudança é chamada de efeito Doppler. O problema é que pequenas vibrações nos instrumentos, mudanças de temperatura e outos fatores podiam causar alterações. Para ter alguma esperança de encontrar novos planetas, os cientistas precisavam eliminar essas incertezas.
O HD 209458 b, ou 'Osiris', foi o primeiro exoplaneta observado passando em frente à sua estrela |
Evolução técnica
"Nosso objetivo desde o início era encontrar planetas", diz Butler. "Mas nossa preocupação principal era o desafio técnico", afirma. Um avanço veio no início dos anos 1980. Dois astrônomos canadenses, chamados Bruce Campbell e Gordon Walker, desenvolveram uma técnica pioneira que podia detectar oscilações de 54 km/h. Com isso eles já teriam sido capazes de descobrir o primeiro exoplaneta antes de Queloz e Mayor, mas tiveram azar. Com melhorias e a evolução técnica, em maio de 1995 os cientistas liderados por Butler já eram capazes de medir velocidades de até 10 km/h. Mas cinco meses depois, eles receberam notícias da Europa: alguém havia encontrado um planeta, o 51 Peg b. Mayor levou meses para se convencer. Ele estava cético no início, pedindo a Queloz que fizesse mais análises para descartar possíveis explicações alternativas. "Eu era um estudante", observa Queloz, hoje pesquisador da Universidade de Cambridge. "Não era para eu encontrar um planeta." Mayor e Queloz mantiveram segredo sobre a descoberta enquanto checavam e rechecavam seus dados. Quando finalmente estavam convencidos, anunciaram sua descoberta em um encontro de astronomia no dia 6 de outubro de 1995, em Florença, na Itália.
O 51 Peg b é uma grande bola de gás como Júpiter, mas é 50% maior |
Planeta estranho
Muitos astrônomos receberam a notícia com ceticismo. No passado, outros cientistas já haviam anunciado descobertas de exoplanetas que depois não se confirmaram. E havia o questionamento sobre o próprio 51 Peg b. O planeta é uma grande bola de gás, como Júpiter. Mas o estranho é que sua órbita é de apenas quatro dias. A distância do planeta para sua estrela é um sexto da distância de Mercúrio para o Sol, o que significa que sua superfície enfrenta temperaturas de até 1.000 graus Celsius. O calor expande sua atmosfera, tornando o planeta 50% maior do que Júpiter, embora seja 47% mais leve. Apelidado de "Júpiter quente", o planeta contradizia tudo o que os cientistas achavam que sabiam sobre os planetas. No Sistema Solar, os gigantes de gás como Júpiter estão longe do Sol. Esses planetas contêm gases e gelo, compostos voláteis que não sobreviveriam em ambientes mais quentes mais próximos ao Sol. Por isso os cientistas acreditavam que somente pequenos planetas rochosos, como a Terra, poderiam se formar na parte interna do Sistema Solar, enquanto os gigantes de gás se formariam na parte externa. O paradoxo de um Júpiter quente levou muitos cientistas a questionar o 51 Peg b. "A mentalidade na época era de que todos os sistemas planetários deveriam se assemelhar ao nosso", observa Butler. Por acaso, Butler e Marcy haviam agendado uma sessão de quatro dias em um observatório na semana seguinte. Eles passaram todas as noites apontando o telescópio para a estrela 51 Pegasi. "Olhamos os resultados e ficamos abismados", conta Butler. "Mayor e Queloz estavam certos. Nós obtivemos exatamente os mesmos resultados."
Chuva de planetas
Vogt ainda não estava trabalhando com Butler e Marcy, mas acompanhava de perto seu progresso. O que o surpreendeu sobre os dados foi ver que, uma vez que eles soubessem o que deviam procurar, não era difícil detectar o 51 Peg b. Por causa de sua órbita curta, dados de apenas alguns dias eram suficientes para revelar a oscilação da estrela. "Se é tão fácil assim detectar, deve haver vários desses planetas", disse. "Eles vão começar a chover." Ao perceber que o 51 Peg b era apenas o início, ele se juntou às buscas. Enquanto Butler e Marcy melhoravam sua técnica, eles observavam estrelas, acumulando oito anos de coletas de dados. Mas eles não tinham capacidade técnica para analisar esses dados. Com a descoberta do 51 Peg b, outros cientistas ofereceram a eles seus computadores para ajudá-los a processar os dados. E Vogt estava certo - os planetas começaram a aparecer. Na manhã do último dia de 1995, Butler foi ao seu escritório para checar seu computador, que analisava dados de uma estrela chamada 70 Virgo. Ele observou então que o programa revelava um planeta com sete vezes o tamanho de Júpiter, orbitando sua estrela a cada 116 dias. A estrela oscilava com velocidades de mais de 1.000 km/h: o sinal mais brilhante e claro já encontrado, o que não deixava nenhuma dúvida de que era um planeta. "Não podia acreditar no início", conta Butler. "Por uma hora, fiquei só olhando a tela do computador."
O 51 Peg b foi o primeiro exoplaneta descoberto na órbita de uma estrela - Nasa/JPL-Caltec |
Formação incerta Enquanto os americanos começavam a encontrar planeta atrás de planeta, os europeus liderados por Mayor também encontravam. As duas equipes acabariam descobrindo centenas de planetas, conforme a competição entre elas crescia na década seguinte. A maioria dos planetas descobertos inicialmente eram "Júpiters quentes" como o 51 Peg b. Como esses planetas são grandes e próximos às suas estrelas, provocam as oscilações mais fortes, deixando-os também mais fáceis de identificar. Nos anos seguintes, mesmo os mais ardorosos céticos, que propuseram explicações alternativas como estrelas pulsantes, estrelas binárias e manchas estelares, tiveram que aceitar que se tratavam de planetas reais. Mas como eles são formados ainda é algo incerto. Uma das explicações mais populares é a de que os planetas semelhantes a Júpiter sofrem uma migração. Eles se formariam longe de suas estrelas, mas se movimentariam depois para a parte interna por força das interações gravitacionais com outros planetas e com a poeira e os detritos cósmicos deixados pela formação do sistema estelar. 'Estamos sozinhos ou não?' Direito de imagem SETI Institute/Danielle Futselaar Image caption O Kepler-138b foi o primeiro exoplaneta menor que a Terra encontrado O que o 51 Peg b certamente fez foi deixar os astrônomos com uma mente mais aberta. Ele mostrou que, no que se refere aos planetas, é quase um vale-tudo, como observa Sara Seager, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos. "Ele determinou que todo o campo de pesquisas deveria esperar surpresas", diz. De fato, o telescópio espacial Kepler mostrou que a maioria dos sistemas planetários não se parece nada com o Sistema Solar. Lançado em 2007, o telescópio encontrou milhares de planetas. Em vez do método da oscilação usada para encontrar o 51 Peg b, o Kepler verifica diminuição na luz da estrela quando um planeta passa em frente a sua órbita. O Kepler encontrou órbitas planetares que são inclinadas, altamente elípticas, e vão contra a direção da rotação da estrela. Alguns planetas orbitam duas estrelas ao mesmo tempo. Os buscadores de planetas estão tão apurados que já encontraram um do tamanho da Terra, que poderia ter água líquida, na órbita da estrela vizinha Proxima Centauri, a apenas 4,2 anos-luz de distância. A descoberta gerou planos ambiciosos para uma viagem interestelar. Com telescópios espaciais como o Kepler e o ainda em desenvolvimento Satélite para Pesquisas de Exoplanetas em Trânsito (TESS, na sigla em inglês), que pode encontrar mais milhares de novos mundos, os astrônomos estão vendo os planetas não como indivíduos, mas como populações inteiras. Isso dá a eles um entendimento mais amplo sobre como os planetas se formam e também mostram como nosso Sistema Solar pode ser singular. Logo, uma nova geração de telescópios vai analisar atmosferas planetárias atrás de sinais de vida. Em poucas décadas, poderemos ter alguma indicação. "É uma questão básica humana para compreender: estamos sozinhos ou não?", diz Vogt. "É uma das questões mais profundas que podemos jamais imaginar. De qualquer maneira, isso vai abalar nossa cultura, toda nossa capacidade de pensamento, se pudermos responder a isso." Leia a versão original desta reportagem em inglês no site BBC Earth/