Post publicado originalmente a 7 de agosto de 2014
RABINO EDIR? QUASE
A construção de sua versão do Templo de Salomão é apenas a
parte mais vistosa da incorporação de símbolos do judaísmo pelo líder
da Igreja Universal
Reportagem de Juliana Linhares e Thaís Botelho publicada em edição impressa de VEJA
De
quipá, xale de orações, barba de profeta e chamado por alguns de seus
pastores de “sumo sacerdote”, o nome dado ao religioso supremo do antigo
povo de Israel. Edir Macedo fez uma mudança surpreendente na narrativa
da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), a maior confissão
neopentecostal do país, criada por ele.
Os elementos da religião judaica que o líder evangélico passou a
incorporar imprimem um novo significado à sua obra magna, o gigantesco
Templo de Salomão do Brás, em São Paulo, inaugurado na semana passada.
Uma vez que Macedo não ficou louco, não rasga dinheiro nem pretende
deixar de arrecadá-lo, a virada judaicizante é analisada fora da Iurd à
luz da carreira excepcionalmente bem-sucedida do homem que partiu de
zero para 1,9 milhão de fiéis em menos de quatro décadas – com um
pequeno encolhimento nos últimos anos, produto da concorrência.
“É uma estratégia de marketing. Ele quer recuperar o que já teve e,
fantasiado assim, dar uma nova guinada em sua teologia. Edir é conhecido
por não ter nenhuma coerência bíblica”, diz um dos maiores líderes
evangélicos do país, e concorrente de Macedo.
O Templo de Salomão, aberto com a presença da presidente Dilma
Rousseff e do governador paulista Geraldo Alckmin, é um sinal de que
Macedo pensa mais do que grande. O templo original, descrito na Bíblia,
foi erguido em Jerusalém no reino de Salomão, quase 1 000 anos antes de
Cristo, como a primeira construção permanente de louvor a Jeová, deus de
Israel. Foi destruído por Nabucodonosor, rei da Babilônia, e
reconstruído em 516 a.C., sob a designação conhecida como Segundo
Templo.
Na catástrofe seguinte, foram as tropas do Império Romano que puniram
uma rebelião não só arrasando o templo como levando o povo judeu à
diáspora. Um Terceiro Templo, místico ou real, é esperado por judeus e
cristãos que acreditam nas profecias sobre o fim dos tempos.
Enquanto isso não acontece, mórmons, maçons e agora a Universal fazem
suas versões. Não é coisa pouca. No ano passado, Macedo falou da
grandiosidade de sua construção e aproveitou para passar o solidéu:
“Pensem em doar 10% – não é o dízimo – ao templo. Só a iluminação dele
custou 22 milhões de reais. Vai somando. As 10 000 cadeiras, mais 22
milhões. As pedras, que vieram de Israel, 30 milhões. O som saiu por 10
milhões. Estamos fazendo tudo do melhor. Amém, pessoal?”.
“O que Macedo quer é superar a Igreja Católica. Esse templo tem
quatro vezes o tamanho do Santuário de Aparecida e é agora a maior
construção religiosa do país”, acredita Ricardo Mariano, professor de
sociologia da USP e especialista em igrejas neopentecostais.
Ele dá exemplos do impulso expansionista da Universal: “Em 37 anos de
existência, ela abriu quase 200 igrejas, dentro e fora do país, tem a
segunda maior rede de TV, um partido político e parte dos 50 milhões de
evangélicos, um quarto da população brasileira”.
Mariano também aponta a conexão teológica das igrejas evangélicas com
o judaísmo, através da ênfase no Antigo Testamento. Robson Rodovalho,
bispo fundador da igreja Sara Nossa Terra, diz que os judeus são
“queridos e protegidos pelos evangélicos; em orações e em
posicionamentos pró-Israel”.
Templos da Universal há anos exibem menorás, candelabros de sete
velas, um dos principais símbolos do judaísmo, mas os paramentos
litúrgicos portados por Macedo e outros pastores em cultos recentes –
quipá, o pequeno chapéu, e talit, o xale branco com listas azuis, que
rabinos e judeus religiosos usam para fazer preces e em cerimônias nas
sinagogas – trazem praticamente uma revolução teológica.
Os obreiros passaram a ser chamados de levitas, como os sacerdotes
bíblicos originais – que deixaram de existir com a destruição do Segundo
Templo -, usando trajes brancos com faixas douradas na cintura. Macedo e
sua família já estão morando no maior dos cinquenta apartamentos
construídos dentro do gigantesco templo.
Ao todo, a obra, inaugurada ainda sem alvará dos bombeiros, custou
685 milhões de reais e inclui detalhes realistas, como oliveiras no
paisagismo e um altar no formato da Arca da Aliança, onde na Antiguidade
se acreditava que estavam guardadas as tábuas com os Dez Mandamentos.
A religião judaica não busca converter novos fiéis e costuma receber
mal a apropriação de seus símbolos. De um ponto de vista neutro, porém,
será muito interessante acompanhar para onde Edir Macedo pretende
conduzir seu povo.
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